segunda-feira, 2 de fevereiro de 2009

Impossível


Já experimentaste subir um rio sem sair de debaixo de água? Já experimentaste sorrir sem mexer o coração? Já experimentaste chover? E o tempo, já experimentaste? Eu nunca experimentei estas coisas. Frustra-me, sabias? Porque tenho de ser limitado? Porque não pode a minha vontade ser sinónimo do acontecimento? Porque tenho de ter a capacidade de pensar e imaginar e sonhar e a inabilidade de o viver? Como se fosse um pássaro sem asas. Sou forçado a ficar no meu ninho, onde vejo todos os meus irmãos passarinhos confortáveis e famintos, à espera da comida que vem cá ter sem nada termos de fazer. Falo com eles, mas não me satisfaz. Não percebem. Têm as suas asitas, que desenvolvem, e começam a caminhar pelo céu. Eu também ando por aí, e caminho pelo céu. Mas só posso ir onde posso ir. Só posso ir onde posso ir e isso não é justo. Se tenho estas asas porque não as posso tornar num portal que me permita existir num nível onde tudo é possível? Porque tenho de viver massacrado com a frustração do não-acontecimento?

Não sei. Já experimentaste experimentar experimentar? Acho que nem isso experimentaste. Espero que sim, sabes? Mas creio que não. E o que é melhor? Ok, vou abandonar a minha resignação e o meu confortável e passageiro sentimento de vítima, e vou tentar ver diferente. Vou. Será melhor a realidade terrena mais ou menos vivida, ou a realidade terrena pelo menos vivida? Será melhor a realidade terrena como o passar de dias infinitos, ou o sonhar com algo diferente que nunca vem? Será melhor almejar o impossível ou contentar-se com o possível? Sim, é isso. Acho que enquanto almejamos o impossível estamos a viver uma pequenina parte do mesmo. É mesmo isso. Os meus irmãos passarinhos talvez vivam metade da sua realidade terrena. Não sei se vivo o mesmo que eles, provavelmente sim, mas acho que o milionésimo por cento que vivo do impossível, apenas usando as minhas asas de papel valem por todas as possíveis partes da realidade terrena, que têm um fim. Quero uma inteira parte de algo que tem um fim, ou uma ínfima parte de algo que nunca acaba?